segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Tribunal do júri Amália Gomes Zappala O Tribunal do Júri, com previsão constitucional no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º, inciso XXXVIII), é uma das instituições que expressam a opção por um Estado Democrático de Direito fundado na soberania popular, na medida em que efetiva a participação do povo na atividade de um dos poderes estatais, ou melhor, do Poder Judiciário. O júri é uma instituição democrática por excelência. Constitui um direito do acusado da prática de crime doloso contra a vida ser julgado “pelos pares”, por juízes leigos, cuja manifestação, ditada pela consciência e livre de fundamentação, representa o poder popular no exercício da função jurisdicional. Em nossa legislação, o júri foi instituído por decreto do Príncipe Regente D. Pedro de Alcântara , em 18 de junho de 1822. Com exceção da Carta Constitucional de 1937, esteve presente em todas as Constituições brasileiras, e a partir do Diploma de 1946, no capítulo dos direitos e garantias individuais. Quanto à sua organização, após substancial modificação ocorrida ainda no regime imperial, poucas alterações sofreu. Permaneceu como única forma de tribunal popular prevista na estrutura do Poder Judiciário, de natureza colegiada, formação heterogênea, rígida divisão de atribuições entre os integrantes, veredictos soberanos e sigilosos. Estas características, somadas à determinação da competência, constituem princípios constitucionais do júri, atuando como garantia dos cidadãos. Dispõe o inciso XXXVIII do art. 5º da Constituição Federal que “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude da defesa A atividade jurisdicional que o Estado desenvolve por meio do processo está limitada pela proteção dos direitos fundamentais das partes através do conjunto de garantias que consubstanciam o devido processo legal, dentre elas, a ampla defesa como corolário de um processo justo. No entanto, para o julgamento pelo júri, como característica essencial da instituição, exige a Constituição que a defesa não seja apenas ampla mas irrestrita, garantindo ao acusado o ilimitado exercício da autodefesa e assegurando-lhe o direito a uma defesa técnica plena, patrocinada por profissional capacitado, cuja efetivação será controlada pelo juiz que preside a sessão do júri. b) o sigilo das votações O julgamento pelo tribunal do júri é público conforme determina a Constituição seja a regra para todos os procedimentos (arts. 5º, LX e 93, IX). O sigilo exigido refere-se tão somente à votação do questionário, ou seja , às respostas dos jurados aos quesitos sobre a materialidade do crime e a culpabilidade do acusado. A determinação constitucional destina-se a assegurar a liberdade do jurado e como conseqüência um julgamento imparcial. Votará o jurado longe do público, do acusado , da vítima , dos familiares e amigos de ambos. Livre de pressões e constrangimentos, em ambiente propício à manifestação livre da vontade. c) a soberania dos veredictos O princípio constitucional da soberania dos veredictos expressa o desejo do legislador constituinte de erigir o júri como última instância na decisão dos crimes de sua competência. A determinação constitucional não proíbe a pluralidade de julgamentos mas estabelece a impossibilidade de outro órgão do Poder Judiciário modificar a decisão proferida pelo júri. Os veredictos podem ser revistos na medida em que, por meio de recurso, o órgão de segundo grau competente reconheça a necessidade de revisão da decisão e determine a realização de um novo julgamento. A soberania não atribui à decisão dos jurados um caráter onipotente ou arbitrário. Se o veredicto não encontra respaldo na prova dos autos, se ilegalidades viciaram o procedimento, outro julgamento , perante um novo corpo de jurados, será realizado e será igualmente soberano para manter a decisão, ou manifestar-se de forma contrária, integral ou parcialmente. d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida Estabelece o texto constitucional que , no tocante à matéria, é o júri o tribunal competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Dessa forma, determinou sua competência mínima e obrigatória, não impedindo que a legislação ordinária a amplie . Os crimes dolosos contra a vida são aqueles previstos no Capítulo I, do título I, da parte especial do Código Penal, compreendendo os artigos 121 a 127 que correspondem aos tipos penais do homicídio; induzimento, instigação ou auxílio a suicídio; infanticídio e as várias modalidades de aborto. O tribunal do júri , como órgão da justiça penal, sempre foi alvo de vigorosas críticas ressaltando a inferioridade de um julgamento por juizes leigos, despreparados, desobrigados de fundamentação de suas decisões, suscetíveis à pressões comprometedoras de sua isenção. No entanto, o júri atravessou incólume a história de nossa legislação graças a ação de seus defensores que ainda o vêm como uma instituição democrática, que ainda encontram, no tribunal popular, uma justificativa política na medida em que o povo, em um regime democrático, tem que participar não somente da elaboração, mas também da aplicação das leis. Consultar: - Silva, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 103-09 e 123-29. - Moraes, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.5. - Bastos, Celso Ribeiro; Martins, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1988, v. 1. p. 426. - Marques, José Frederico. A instituição do júri. Campinas: Bookseller, 1997, p. 19-67 - Marques, José Frederico. O júri no direito brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1955, p. 55-77 - Nucci, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p.79-177 Amália Gomes Zappala é bacharel em Filosofia pela USP, bacharel em Direito pela USP, Doutora em Processo Penal pela USP, professora de processo penal na Universidade São Judas Tadeu, membro fundador do ASF – Instituto de Estudos Avançados de Processo Penal, advogada.

Tribunal do júri travada

Amália Gomes Zappala
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O Tribunal do Júri, com previsão constitucional no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º, inciso XXXVIII), é uma das instituições que expressam a opção por um Estado Democrático de Direito fundado na soberania popular, na medida em que efetiva a participação do povo na atividade de um dos poderes estatais, ou melhor, do Poder Judiciário.
O júri é uma instituição democrática por excelência. Constitui um direito do acusado da prática de crime doloso contra a vida ser julgado “pelos pares”, por juízes leigos, cuja manifestação, ditada pela consciência e livre de fundamentação, representa o poder popular no exercício da função jurisdicional.
Em nossa legislação, o júri foi instituído por decreto do Príncipe Regente D. Pedro de Alcântara , em 18 de junho de 1822. Com exceção da Carta Constitucional de 1937, esteve presente em todas as Constituições brasileiras, e a partir do Diploma de 1946, no capítulo dos direitos e garantias individuais.
Quanto à sua organização, após substancial modificação ocorrida ainda no regime imperial, poucas alterações sofreu. Permaneceu como única forma de tribunal popular prevista na estrutura do Poder Judiciário, de natureza colegiada, formação heterogênea, rígida divisão de atribuições entre os integrantes, veredictos soberanos e sigilosos.
Estas características, somadas à determinação da competência, constituem princípios constitucionais do júri, atuando como garantia dos cidadãos. Dispõe o inciso XXXVIII do art. 5º da Constituição Federal que “é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude da defesa
A atividade jurisdicional que o Estado desenvolve por meio do processo está limitada pela proteção dos direitos fundamentais das partes através do conjunto de garantias que consubstanciam o devido processo legal, dentre elas, a ampla defesa como corolário de um processo justo. No entanto, para o julgamento pelo júri, como característica essencial da instituição, exige a Constituição que a defesa não seja apenas ampla mas irrestrita, garantindo ao acusado o ilimitado exercício da autodefesa e assegurando-lhe o direito a uma defesa técnica plena, patrocinada por profissional capacitado, cuja efetivação será controlada pelo juiz que preside a sessão do júri.

b) o sigilo das votações
O julgamento pelo tribunal do júri é público conforme determina a Constituição seja a regra para todos os procedimentos (arts. 5º, LX e 93, IX). O sigilo exigido refere-se tão somente à votação do questionário, ou seja , às respostas dos jurados aos quesitos sobre a materialidade do crime e a culpabilidade do acusado.
A determinação constitucional destina-se a assegurar a liberdade do jurado e como conseqüência um julgamento imparcial. Votará o jurado longe do público, do acusado , da vítima , dos familiares e amigos de ambos. Livre de pressões e constrangimentos, em ambiente propício à manifestação livre da vontade.

c) a soberania dos veredictos
O princípio constitucional da soberania dos veredictos expressa o desejo do legislador constituinte de erigir o júri como última instância na decisão dos crimes de sua competência. A determinação constitucional não proíbe a pluralidade de julgamentos mas estabelece a impossibilidade de outro órgão do Poder Judiciário modificar a decisão proferida pelo júri.
Os veredictos podem ser revistos na medida em que, por meio de recurso, o órgão de segundo grau competente reconheça a necessidade de revisão da decisão e determine a realização de um novo julgamento.
A soberania não atribui à decisão dos jurados um caráter onipotente ou arbitrário. Se o veredicto não encontra respaldo na prova dos autos, se ilegalidades viciaram o procedimento, outro julgamento , perante um novo corpo de jurados, será realizado e será igualmente soberano para manter a decisão, ou manifestar-se de forma contrária, integral ou parcialmente.

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida
Estabelece o texto constitucional que , no tocante à matéria, é o júri o tribunal competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Dessa forma, determinou sua competência mínima e obrigatória, não impedindo que a legislação ordinária a amplie .
Os crimes dolosos contra a vida são aqueles previstos no Capítulo I, do título I, da parte especial do Código Penal, compreendendo os artigos 121 a 127 que correspondem aos tipos penais do homicídio; induzimento, instigação ou auxílio a suicídio; infanticídio e as várias modalidades de aborto.

O tribunal do júri , como órgão da justiça penal, sempre foi alvo de vigorosas críticas ressaltando a inferioridade de um julgamento por juizes leigos, despreparados, desobrigados de fundamentação de suas decisões, suscetíveis à pressões comprometedoras de sua isenção.
No entanto, o júri atravessou incólume a história de nossa legislação graças a ação de seus defensores que ainda o vêm como uma instituição democrática, que ainda encontram, no tribunal popular, uma justificativa política na medida em que o povo, em um regime democrático, tem que participar não somente da elaboração, mas também da aplicação das leis.


Consultar:
- Silva, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 103-09 e 123-29.
- Moraes, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p.5.
- Bastos, Celso Ribeiro; Martins, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1988, v. 1. p. 426.
- Marques, José Frederico. A instituição do júri. Campinas: Bookseller, 1997, p. 19-67
- Marques, José Frederico. O júri no direito brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1955, p. 55-77
- Nucci, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p.79-177


Amália Gomes Zappala é bacharel em Filosofia pela USP, bacharel em Direito pela USP, Doutora em Processo Penal pela USP, professora de processo penal na Universidade São Judas Tadeu, membro fundador do ASF – Instituto de Estudos Avançados de Processo Penal, advogada.

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